Uva Niagara No Estado De São Paulo: Aspectos Da Produção, Da Comercialização E De Mudanças Na Tecnologia Adotada

            Na safra 2000/2001, a produção paulista de uva comum para mesa situou-se em 104,8 mil toneladas e ocupou 7.626 hectares, tendo apresentado aumento de 10,4% em relação à produção da safra 1999/2000, conforme dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA) e Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI).
            No Estado, a região do Escritório de Desenvolvimento Rural (EDR) de Campinas é a maior produtora de uva comum para mesa, respondendo por cerca de 70% da produção e da área plantada. Nesse EDR, os principais municípios produtores, ordenados segundo a quantidade produzida, são: Jundiaí, Indaiatuba, Itupeva, Louveira, Campinas, Vinhedo e Valinhos. A variedade predominante é a Niagara, principalmente a rosada, que se apresenta mais atraente que a branca ao consumidor brasileiro. Em regiões vizinhas de Campinas, nos EDRs de Itapetininga, Sorocaba e Bragança Paulista, são produzidos quase todos os demais 30% da produção estadual.
            Nos últimos tempos, têm sido crescentes as necessidades de se aumentar o conhecimento e de se obter o maior número de informações sobre a viticultura paulista, em razão tanto da já elevada importância econômica para diversos produtores e municípios paulistas, quanto da grande capacidade de absorção de mão-de-obra e de geração, elevação e melhoria da distribuição da renda propiciadas pela atividade, que conta, inclusive, com grande potencial para contribuir com a melhoria das contas externas da economia brasileira .
            Nesse sentido, visando fornecer informações relevantes para a tomada de decisões fundamentadas, foram elaboradas estimativas de custo e de rentabilidade da cultura de uva Niagara no Estado de São Paulo, que deverão ser publicadas num dos próximos números da revista Informações Econômicas do IEA. Os dados básicos desse trabalho foram obtidos junto a sete produtores paulistas, situados nos municípios de Indaiatuba e de Louveira, sendo a seguir abordados alguns aspectos da atividade relativos à produção, comercialização e mudanças técnicas.
            Os produtores estudados são representativos da maioria das propriedades da região, em termos de tamanho, área cultivada e tecnologia adotada, verificando-se grande especialização na atividade. A uva é praticamente a única fonte de receita em 6 dessas 7 propriedades, sendo 4 pequenas, cada uma com área total de 5 a 12 hectares, e duas maiores, com área total de 24 e 46 hectares. Nessas menores, a área cultivada com uva situa-se em torno de 70% da área total da propriedade, e nas duas maiores esse percentual situa-se ao redor de 40%. Apenas uma das 7 propriedades, com 48 hectares, tem área cultivada com uva ocupando pequena parcela (7%) da área total.
            A atividade apresenta como uma das suas principais características o fato de ser conduzida principalmente em áreas pequenas e médias, por tradicionais produtores. Verifica-se, também, ser usual um mesmo produtor cultivar mais de uma área na região, áreas essas que tanto podem ser próprias ou arrendadas, ou seja, registra-se também condução da atividade por produtores com mais de uma pequena propriedade.
            Um vinhedo geralmente é constituído por várias quadras, de diversos tamanhos e números de pés. A formação de uma quadra de uva envolve investimentos durante cerca de 18 meses, em duas etapas. O primeiro período de formação (preparo do solo, porta-enxerto e tratos culturais) estende-se por aproximadamente 15 meses e os três meses seguintes são considerados como o segundo período de formação (enxertia e tratos culturais).
            As formações das quadras são custeadas pelos proprietários. Em seguida, nas safras em produção, a cultura é geralmente conduzida através de parceria com um casal de meeiros para cada hectare (5.000 pés) de uva. Essa é a organização da produção que se tem demonstrado a mais apropriada para a região, em decorrência tanto das exigências de mão-de-obra especializada, quanto das especificidades da atividade e de conseqüentes dificuldades relacionadas com a legislação trabalhista.
            Os contratos vigentes entre os proprietários e meeiros da região usualmente estipulam que a mão-de-obra deve ser fornecida pelo meeiro e que as despesas, que envolvem elevados desembolsos efetivos por unidade de área (máquinas e equipamentos, seguros, encargos bancários e, principalmente, materiais consumidos na produção), devem ser cobertas pelo proprietário. O resultado líquido da atividade (receita menos despesa total) deve distribuir-se na mesma proporção (50%) entre os parceiros.
            Com relação às mudanças na tecnologia adotada, as conclusões basearam-se nas quadras em produção e na comparação dos dados obtidos no presente estudo com os de custo de produção elaborados pelo IEA em meados da década de oitenta. Observou-se que, embora a atividade continue a utilizar intensamente mão-de-obra, se tem ao longo desse período acentuada redução nos dias trabalhados por hectare em produção, que se situam em 162 dias no ano 2000, o que corresponde à metade dos 331 dias considerados em meados da década de oitenta.
            Destacam-se ao longo dos últimos 15 anos dois pontos importantes, com grande impacto no custo de produção e na utilização de mão-de-obra, que estão relacionados com os tratos culturais e a condução dos pés (operação em que se efetua a desbrota e a amarração dos galhos).
            O primeiro ponto diz respeito à introdução do grampeador na condução dos pés , em substituição às palhas anteriormente utilizadas, o que acarretou redução de aproximadamente três quartos na quantidade de mão-de-obra utilizada na operação e grande redução nos custos. Isso implicou também em aumento da sazonalidade, com acentuada concentração do uso do fator em um período menor do ano. Enquanto que anteriormente os dias trabalhados na condução dos pés, entre agosto e novembro, eram equivalentes aos despendidos com a etapa da colheita e embalagem (novembro a fevereiro), essa última , que apresentou pequena evolução na mecanização (basicamente no transporte interno da produção), atualmente absorve praticamente o dobro dos dias utilizados na condução.
           O segundo ponto relaciona-se à adoção da prática de forração, operação que consiste em cobrir com capim cerca da metade da área cultivada, acarretando melhoria nas condições do solo, com redução no número de capinas e nos dias de uso de mão-de-obra. Esse material geralmente passou a ser adquirido em propriedades maiores da região, sendo o corte e manuseio (carregamento e descarregamento) efetuados pelos meeiros e o transporte custeado pelo proprietário. Recentemente, em razão dos custos e dificuldades dessa prática - em termos de grande utilização de mão-de-obra, com trabalho penoso e de elevados riscos físicos para os trabalhadores -, tem-se verificado mudanças no sentido de aquisição para entrega na propriedade e de substituição do capim por outros materiais (principalmente bagaço de cana-de-açúcar).
            Na produção, a elevada magnitude do custo dessa operação de forração, prática cuja adoção implicou aumento nos desembolsos dos proprietários, tem motivado a busca de técnicas alternativas, que visem à redução nos custos e que contribuam inclusive para a manutenção e a melhoria das condições do solo, como, por exemplo, adubação verde. Experimentos nesse sentido encontram-se em desenvolvimento e avaliação na região no momento.
            Na comercialização, os dispêndios com as caixas de uva absorvem a maior parcela da despesa total da atividade. Observa-se, ainda, que na região a venda do produto é efetuada principalmente nas propriedades, sendo usual que parcela da produção seja vendida em caixas retornáveis, cedidas pelo comprador, o que acarreta significativa redução do uso de mão-de-obra e dos dispêndios com materiais. No curto prazo, essa prática contribui para melhoria do fluxo de caixa dos produtores, elevação da rentabilidade da atividade e aumento das remunerações dos proprietários e dos meeiros.
            Por outro lado, a médio e longo prazos, remunerações mais favoráveis deverão estar atreladas à comercialização que privilegie a qualidade do produto. Nessa questão, a classificação, a embalagem e o certificado de origem (que garante a rastreabilidade do produto) são elementos essenciais a serem considerados no gerenciamento da atividade. Nesse sentido, é importante estimular-se a adoção das normas de classificação da uva Niagara, as quais foram definidas em trabalho finalizado recentemente (setembro/2001) pelo Centro de Qualidade em Horticultura da CEAGESP, em parceria com produtores paulistas, dentro do Programa Brasileiro para a Melhoria dos Padrões Comerciais e Embalagens de Hortigrangeiros.
 

 

Data de Publicação: 01/11/2001

Autor(es): Arthur Antonio Ghilardi (arthurghi@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Maria Lucia Maia (mlmaia@iac.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor